
A bioeconomia vem ganhando cada vez mais importância nos últimos anos no Brasil e no mundo. Proposta como uma alternativa ao modelo econômico tradicional, ela combina sustentabilidade com inovação e ciência para permitir o uso de recursos naturais renováveis em processos industriais que sejam mais positivos para o meio-ambiente e para a sociedade.
Assim, ela seria essencial para a substituição dos recursos fósseis e não renováveis, como o petróleo.
No Brasil, país com maior biodiversidade do mundo, a bioeconomia tem um enorme potencial. Não à toa, esse será um dos grandes temas da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), evento que o Brasil vai sediar neste ano, reunindo lideranças do mundo todo para discutir as ações necessárias para enfrentar as mudanças climáticas.
A agenda é tão importante para o Brasil que, no ano passado, o governo federal instituiu a Estratégia Nacional de Bioeconomia, para implementar políticas públicas destinadas ao desenvolvimento da bioeconomia no país. Além disso, o governo anunciou também R$ 468,38 bilhões em investimentos públicos e privados na chamada “Missão 5 da Nova Indústria Brasil”, que envolve bioeconomia, descarbonização, transição e segurança energética.
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O que é a bioeconomia?
A ideia por trás da bioeconomia — de repensar o uso de recursos naturais dentro dos limites ecológicos do planeta — começou a ganhar força nos anos 1970, com economistas como o romeno Nicholas Georgescu-Roegen.
Considerado o fundador da bioeconomia, embora ele nunca tenha usado o termo diretamente, Georgescu-Rogen questionava o paradigma do crescimento econômico infinito. Para ele, o foco deveria estar no uso mais justo e sustentável dos recursos.
Desde então, o conceito se desdobrou em três grandes visões:
1. Biotecnológica: aposta na inovação e na ciência para criar soluções industriais com base biológica. Um exemplo é o uso de plantas e bactérias para produzir bioplásticos.
2. De Biorrecursos: enfoca na substituição de combustíveis fósseis por biomassa e outros recursos naturais, como no caso do etanol de segunda geração, produzido através de resíduos da cana-de-açúcar, e da energia renovável feita a partir da biomassa gerada na produção de papel e celulose
3. Bioecológica: prioriza processos ecológicos que respeitam a biodiversidade e evitam a degradação ambiental. Um exemplo disso são sistemas de produção menores que incorporam atividades e conhecimentos tradicionais de uma comunidade, respeitando as capacidades do bioma e atuando em harmonia com o ambiente.
Mas, seja qual for o enfoque, a bioeconomia une conhecimentos e tecnologias com o uso de recursos naturais para criar ciclos produtivos mais sustentáveis.
“A bioeconomia desloca o eixo de desenvolvimento de recursos como os combustíveis fósseis para algo que pode ser renovável e de menor impacto ambiental”, diz Jaques Paes, professor do MBA de ESG e Sustentabilidade da FGV.
Assim, ela pode envolver setores como agricultura, silvicultura, pesca, biotecnologia, energia renovável, química verde, cosméticos, fármacos, têxteis e produção de alimentos, entre outros.
Qual é a importância da bioeconomia?
Com as mudanças climáticas ameaçando cada vez mais a existência não só de espécies e biomas inteiros no planeta, mas também a sobrevivência da própria humanidade, encontrar modelos econômicos que tenham uma dinâmica regenerativa é essencial.
“Em tempos de crise climática, buscamos por uma cadeia produtiva mais resiliente, e encontramos na bioeconomia uma espécie de reindustrialização verde”, diz Jaques.
No Brasil, a bioeconomia tem sido vista como importante para permitir o desenvolvimento sustentável na Amazônia, por exemplo. Ela pode nos ajudar a conhecer melhor a nossa fauna e flora e, a partir disso, desenvolver novos fármacos, cosméticos e outros produtos — tudo isso preservando a biodiversidade.
O crescimento desse tipo de modelo de negócio tem sido acompanhado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que estima que a bioeconomia deve responder, até 2030, por até 2,7% do PIB de seus países membros.
Como a bioeconomia se relaciona com a economia circular?
A economia circular é outro conceito importante que voltou a ganhar força nos últimos anos. Criada no fim dos anos 80, ela propõe que, ao se desenvolver um produto, se leve em conta toda a sua cadeia produtiva — inclusive o seu destino final.
O “fim de vida” do produto deve incluir alguma forma de reaproveitamento: seja por reutilização, reciclagem, recuperação ou até compostagem. O objetivo é manter o valor dos produtos e materiais pelo maior tempo possível e gerar o mínimo de resíduos.
É por isso que esse conceito ficou conhecido como “do berço ao berço” — metáfora que descreve um ciclo contínuo de reaproveitamento semelhante ao da natureza, na qual tudo se renova.
A economia circular complementa a bioeconomia ao propor um novo olhar para o desenho de processos e produtos, alinhado com a sustentabilidade.
“É como se a bioeconomia nos dissesse qual produto usar, qual recurso renovável usar e nos desse os meios tecnológicos para isso; e a economia circular descrevesse o modelo de uso dessa matéria-prima”, diz Jaques.
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Exemplos de bioeconomia
Já existem várias atividades que mostram a bioeconomia em ação.
“Temos uma série de modelos que usam conceitos da bioeconomia e da economia circular, como design regenerativo, buscar materiais de origem natural, fazer embalagens que se decompõem da natureza, uso de recursos renováveis para gerar energia”, diz Jaques.
Na Suzano, por exemplo, os produtos são baseados em recursos renováveis: árvores manejadas de maneira sustentável para a fabricação de matérias-primas como papel e celulose. A companhia investe também em buscar soluções mais sustentáveis para ajudar a resolver um problema da sociedade: substituir materiais de origem fóssil. A lignina é um exemplo. Ao lado da celulose, ela constitui a maior parte da madeira das árvores e é uma alternativa renovável para produtos como itens de borrachas, tintas, plásticos resistentes ao calor e maquiagem.
Confira outras aplicações da bioeconomia
Energia a partir de resíduos: resíduos orgânicos da agricultura, pecuária e até de aterros sanitários podem ser reaproveitados para gerar energia elétrica ou biocombustíveis, aproveitando o gás produzido na decomposição desses materiais.
Etanol de segunda geração: obtido a partir de biomassas como bagaço da cana-de-açúcar, por exemplo, transforma resíduos em combustível renovável.
Substituição de agrotóxicos: pragas e doenças podem ser controladas com o uso de organismos vivos — predadores naturais, parasitoides ou até bactérias específicas. A Suzano, por exemplo, tem uma iniciativa pioneira no Brasil que usa joaninhas para combater pragas do eucalipto. Além disso, fertilizantes sintéticos podem ser trocados por insumos biológicos para aumentar a produtividade de culturas como soja, milho e celulose. A Suzano também investe nesse tipo de alternativa, reaproveitando resíduos da produção. Saiba mais sobre isso no Relatório de Sustentabilidade da companhia.
Como promover a bioeconomia?
O desenvolvimento da bioeconomia depende de investimento em pesquisa e inovação. Universidades, centros de pesquisa, empresas e startups precisam de apoio para explorar novos usos dos recursos renováveis, desenvolver tecnologias e produzir bioprodutos.
Políticas públicas e parcerias público-privadas também são essenciais. Subsídios, incentivos fiscais e regulamentações específicas ajudam a incentivar o crescimento da bioeconomia.
Do lado do consumidor, cada pessoa pode ajudar a promover a bioeconomia fazendo escolhas mais conscientes.
“É preferir produtos cuja fonte a gente conheça, de empresas comprometidas com essa política, que sabemos que tratam os resíduos de forma consciente e que tomem esse cuidado em toda sua cadeia produtiva”, diz Jaques. “É importante entender nosso lugar de consumo e como a gente pode fomentar indústrias mais conscientes”.
Quais são os desafios desse modelo de negócio?
A bioeconomia é multidisciplinar por natureza, integrando diversos setores e áreas do conhecimento — o que, por si só, já representa um desafio.
De um lado, os cientistas precisam estar conectados com as demandas da sociedade e da indústria para desenvolver tecnologias sustentáveis. De outro, os setores produtivos precisam operar de forma integrada, especialmente quando falamos de reaproveitamento de materiais – e avaliar o investimento necessário para que isso seja possível.
“Todos esses insumos da bioeconomia, como os resíduos ou uma matéria-prima, precisam entrar em um fluxo entre diferentes indústrias, e isso envolve questões de infraestrutura”, diz Jaques. “Por exemplo, fábricas em locais remotos precisam pensar em questões de transporte, logística e armazenamento”.
Outro desafio, para Jaques, é garantir a continuidade de programas públicos de incentivo à bioeconomia. “É preciso que essas sejam políticas de Estado, e que não sejam alteradas por conta de mudanças no governo”, afirma.
E, por fim, o desenvolvimento da bioeconomia também precisa ser socialmente justo. Em regiões como a Amazônia, por exemplo, é essencial, durante todo o processo, envolver as comunidades locais, que também devem ser percebidas como protagonistas no processo — respeitando e valorizando seus conhecimentos, sua cultura e sua autonomia.
Como esse tópico está sendo discutido pela agenda do desenvolvimento sustentável (ODS) da ONU?
A bioeconomia pode ser uma ferramenta estratégica para alcançar vários dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, estabelecidos na Agenda 2030.
Isso porque o modelo de produção e consumo baseado no uso inteligente e sustentável de recursos biológicos tem impactos diretos e indiretos sobre uma série desses objetivos. A seguir, listamos alguns desses exemplos:
ODS 2 – Fome Zero e Agricultura Sustentável
Ao inserir cada vez mais práticas agrícolas mais sustentáveis, com uso de biofertilizantes e controle biológico de pragas, a bioeconomia ajuda a aumentar a produtividade de forma sustentável, preservando solos e ecossistemas.
ODS 6 – Água Potável e Saneamento
Como a bioeconomia incentiva o reaproveitamento de resíduo e uso de tecnologias limpas, ela contribui para reduzir a poluição hídrica e para o uso eficiente da água em atividades produtivas.
ODS 7 – Energia Limpa e Acessível
A produção de biocombustíveis e bioenergia permite a migração de um sistema energético baseado em recursos não renováveis para uma matriz energética limpa e sustentável.
ODS 8 e 10 – Trabalho Decente e Redução das Desigualdades
A bioeconomia também pode ser uma grande impulsionadora de emprego e renda em áreas rurais e tradicionais, sempre respeitando a cultura e conhecimentos locais. Isso contribui para a inclusão social, redução de desigualdades e geração de oportunidades em regiões vulneráveis.
ODS 12 – Consumo e Produção Responsáveis
Ao promover cadeias de valor circulares, incluindo o reaproveitamento de materiais, redução de resíduos e uso de matérias-primas renováveis, a bioeconomia incentiva o consumo e produção responsáveis.
ODS 13, 14, E 15 – Ação Contra a Mudança Global Climática, Vida na Água e Vida Terrestre
A bioeconomia pode ajudar no combate à mudança climática e na proteção da vida marinha e terrestre promovendo a restauração de áreas degradas e valorizando a biodiversidade como base produtiva, evitando geração de resíduos e de impactos negativos no meio-ambiente.
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Conclusão
A bioeconomia, como vimos, é muito mais do que simplesmente usar recursos renováveis. Ela representa uma nova forma de pensar a economia: mais conectada com a ciência, com os saberes tradicionais e com a sustentabilidade. É uma ponte entre inovação e conservação, entre novas tecnologias e comunidades, entre desenvolvimento e responsabilidade ambiental.
Ela permite produzir riqueza sem comprometer a biodiversidade, valorizar os territórios e povos tradicionais e, ao mesmo tempo, contribuir com a mitigação da crise climática e com a redução da nossa dependência de combustíveis fósseis.
Mais do que uma tendência, a bioeconomia é uma necessidade – e uma oportunidade para repensar os caminhos do desenvolvimento.